As bebidas e alimentos guardados na geladeira ou na despensa, os cosméticos e os remédios na prateleira do banheiro e até os defensivos agrícolas têm em comum o uso de rótulos autoadesivos em suas embalagens.
Esses rótulos tornam-se um desafio porque, muitas vezes, dificultam a reciclagem das embalagens, ou, quando se consegue retirá-los simplesmente são descartados em aterros. Mas esse é só um ponto da questão, já que a geração de resíduos relacionados aos rótulos começa ainda na sua confecção e aplicação.
E foi buscando uma solução para esse resíduo que a multinacional Avery Dennison, especializada em design e produção de uma grande variedade de materiais para rotulagem, criou em 2019 o programa AD Circular, que busca desviar dos aterros e da incineração aqueles resíduos que são “invisíveis” para o consumidor final mas que representam, segundo a companhia, mais de 1 milhão de toneladas de material descartado em todo o mundo.
Cecília Mazza, gerente de sustentabilidade da Avery Dennison na América Latina, explica:
“60% do material que sai das nossas plantas se converte em resíduos que geralmente vão para aterros ou são incinerados. É aí que começa a nossa responsabilidade em redirecionar esse material.”
Segundo ela, 88% desse resíduo é composto por liner papel, liner pet e esqueletos, todos gerados no processo de impressão, corte e aplicação dos rótulos autoadesivos.
O esqueleto é gerado nos chamados convertedores – como as gráficas – que imprimem e cortam o rótulo. É como se fosse aquela folha que sobra depois de destacadas as etiquetas. Já o liner é um tipo de papel com silicone que dá suporte ao adesivo e é um resíduo gerado pelas marcas depois que o rótulo é aplicado nas embalagens.
São resíduos complexos de reciclar justamente por conter componentes químicos e adesivos agregados. Por isso, a solução passa por diversos parceiros que ajudam tanto na captação de empresas que necessitam da reciclagem quanto de recicladores já disponíveis no mercado.
Hoje, o AD Circular tem parceria com a Boomera Ambipar, que atua criando cadeias e metodologias de Economia Circular, além das recicladoras Polpel, Ambigraf e Ecoplastic.
“Uma vez que encontramos interesse das empresas, analisamos, junto com a Boomera, a melhor forma para garantir a reciclagem do material. Analisamos, por exemplo, se é necessária alguma adaptação na planta. Também podemos ensinar uma correta separação do material, ou mesmo recomendar uma logística economicamente viável. São elementos com os quais podemos colaborar para que a conexão do material que será reciclado seja realmente efetiva”, explica Cecília.
Entre as marcas que já fazem parte do programa estão Natura, C&A, Ourofino, Sakura, Coty e Pernod Ricard. Ao todo, são 60 empresas parceiras, incluindo convertedores, marcas e recicladores.
Uma vez parte do programa, os geradores de resíduos se conectam aos recicladores que transformam o liner papel em polpa celulósica e papel toalha (utilizado, inclusive, na operação da Avery Dennison no Brasil). O liner pet vira fitilho para a amarração de fardos, e os esqueletos, em cinta de arquear utilizada na amarração de carga.
Também é possível buscar soluções que atendam às demandas de cada uma das empresas. A Natura, por exemplo, transformou, em 2 anos, mais de 49 toneladas destes resíduos em papel cartão utilizado como embalagem de produtos da linha Ekos. Os resíduos foram transformados em polpa celulósica pela Polpel e em papel cartão pela MD Papéis.
ALÉM DE GRATUITO PARA MARCAS, O PROGRAMA AJUDA COM AS METAS E AMBIÇÕES ESG
Desde o início do programa em 2019 foram recicladas 4.600 toneladas de resíduos. Para 2022, a meta é acrescentar mais 3 mil toneladas a este montante. Para isso, o desafio é trazer novos parceiros, além de expandir geograficamente o programa. A meta da companhia é que, até 2025, 70% de toda a cadeia tenha acesso à reciclagem de liner e esqueleto.
Por enquanto, a Avery Dennison está financiando integralmente o projeto e oferecendo a solução gratuitamente para as empresas. Mas a ideia é crescer em volume de participantes para poder diluir os custos, o que esbarra no desafio da logística de um país continental como o Brasil.
“Estamos em São Paulo e temos vários clientes que são próximos, o que facilita o trabalho. Quando vamos para o Norte e Nordeste, por exemplo, há menos clientes concentrados nas capitais”, diz Alexandre Botelho, diretor de Compras Sênior de Label and Graphic Materials da América Latina.
Por causa das dificuldades logísticas, a Avery Dennison faz, junto com a Boomera, uma análise de viabilidade das empresas para entender se faz sentido – logística e financeiramente- oferecer o programa a elas. Alexandre explica:
“O nosso planejamento prevê que vamos oferecer o programa para todo mundo. Só não sabemos, ainda, quando. Para que isso aconteça, é preciso ter mais volume dentro dos grandes centros. Precisamos de massa para diluir os custos e tornar o programa mais acessível para toda a cadeia sem que a despesa recaia somente sobre um elo.”
Diretamente conectado a uma das 3 metas de sustentabilidade da Avery Dennison para 2030, que é “reduzir o impacto ambiental nas operações e cadeia de suprimentos”, o programa traz benefícios para as marcas parceiras dentro de suas estratégias de sustentabilidade.
O AD Circular ajuda as companhias a ter uma melhor gestão de parte dos resíduos de sua operação, o que contribui para muitas metas ESG. De acordo com o volume de resíduos gerados, a companhia pode, por exemplo, receber certificados ou relatórios de descarte, importante no cumprimento da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Além disso, o programa tem rastreabilidade, apontando como e em quais proporções a reciclagem está sendo feita.
“As marcas não têm nenhum custo com o programa e, provavelmente, têm algum benefício econômico porque deixam de mandar o resíduo para aterro ou incineração. Além disso, elas conseguem rastrear os materiais reciclados e, se há metas relacionadas aos resíduos, o programa pode ajudá-las a cumprir”, avalia Cecília.
NO FUTURO, SOLUÇÕES INOVADORAS SERÃO NECESSÁRIAS
Enquanto busca ampliar o alcance do programa AD Circular, a Avery Dennison já tem no radar outro desafio que deve chegar em breve e tem a ver com a instalação, no Brasil, de uma unidade de negócios focada em etiquetas inteligentes, como as RFID, que traz tecnologia aplicada.
A produção desse material vai gerar um novo tipo de resíduo para o qual a companhia também vai precisar pensar em descarte correto.
“Essa será uma nova preocupação, porque seremos responsáveis por esse lixo. Tecnicamente, há algumas características diferentes do que geramos hoje dentro da divisão de etiquetas e vamos começar a trabalhar para entender a parte técnica e científica desse material. Saber como dar a destinação correta para ele é uma preocupação que começamos a ter agora”, diz Alexandre.
Uma das apostas da empresa para ajudar na busca de soluções é o programa de aceleração de startups AD Strectch, lançado recentemente para identificar e resolver grandes desafios nas áreas de sustentabilidade, experiência do cliente e cadeias de valor.
O programa está recebendo inscrições até 20 de março, mas existe uma expectativa de que essa aproximação com startups traga novas soluções para desafios tão complexos já existentes e ou que ainda vão surgir.
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