A Danone virou uma das maiores Empresas B do planeta. E quer usar o tamanho de sua cadeia de valor para fazer a diferença

Em março, a Danone comunicou ao mercado que se tornou a primeira grande indústria alimentícia do país com o selo de Empresa B. A certificação atesta que a cadeia de valor da companhia no Brasil está atrelada à sustentabilidade social e ambiental.

A chancela da subsidiária brasileira se encaixa numa estratégia mais ampla da multinacional francesa. É o que afirma Cibele Zanotta, diretora de Corporate Affairs da Danone Brasil:

“Hoje, 50% do nosso faturamento global já vem das nossas subsidiárias com a certificação B. Globalmente, temos a meta de ser uma empresa totalmente B até 2025 — a meta era 2030, mas nós antecipamos”

Advogada de formação, Cibele está na Danone há mais de 13 anos. Começou no jurídico, passou pelas áreas de lácteos e regulação, até assumir a cadeira atual, em que cuida (entre outras coisas) de garantir que a sustentabilidade permeie toda a companhia.

Segundo ela, empresas menores que fazem parte do Sistema B muitas vezes “já nascem com esse mindset”. Isso é bem mais raro quando se trata de uma gigante fundada em 1919, com mais de 100 mil funcionários, 190 fábricas e produtos que chegam a mais de 120 países.

“Você não se torna uma Empresa B de um dia para o outro, isso vem lá de trás. E quando a gente fala numa cadeia de valor extremamente grande, complexa… Acredito que precisamos usar a escala da nossa companhia para fazer diferença.”

A Danone Brasil tem 4 500 colaboradores e se compõe de três unidades de negócios: EDP (Essential Dairy and Plant-based, produtos lácteos e de base vegetal), Águas e Danone Nutricia. As quatro fábricas brasileiras ficam em Minas Gerais e São Paulo. Segundo a empresa, uma delas, em Poços de Caldas (MG), já é abastecida com painéis solares e destina todo seu resíduo a reciclagem, compostagem ou geração de energia.

Das três unidades, EDP engloba leite, requeijão, os iogurtes que deram fama à companhia e a Silk, linha de bebidas à base de amêndoas, coco, cacau e castanha-de-caju que se incorporou ao portfólio com a aquisição da WhiteWave Foods, em 2016. A divisão de Águas engarrafa a marca Bonafont. Danone Nutricia tem foco em nutrição infantil e envelhecimento saudável.

COMO A COMPANHIA FOMENTA OS PEQUENOS PRODUTORES DE LEITE

Leite é provavelmente o insumo mais importante da Danone, indispensável para a produção do iogurte que está na origem da empresa.

Isso não impediu a companhia de privilegiar o pequeno produtor ao desenhar sua cadeia de fornecimento. Cibele explica:

“Hoje, 70% do nosso volume de leite é captado de pequenos produtores rurais. Sabemos que é um setor extremamente informal, então temos programas de capacitação e profissionalização para esses produtores. Isso traz uma melhora para os negócios e para a qualidade do produto final desses fornecedores”

A Danone conta com cerca de 300 pequenos produtores (cada um gerando até mil litros de leite por dia), a maioria baseada em Minas Gerais. Para estimular esses negócios, a companhia patrocina uma série de programas, promovendo de capacitação financeira a assistência técnica e regularização.

Implementada em 2005, a Central de Compras funciona como um mecanismo de compra coletiva para a cadeia leiteira. Os pedidos (de insumos para a dieta das vacas a equipamentos agrícolas) são reunidos numa plataforma única, aumentando o poder de barganha por melhores preços e condições de pagamento.

“O produtor não desembolsa nada diretamente, o valor é descontado a partir do seu faturamento com a venda do leite. Mais de 90% dos produtores utilizam ou já utilizaram a Central de Compras, provando que é possível levar benefícios e agregar valor simultaneamente às fazendas”

Outra iniciativa é o programa Mais Sólidos, que reconhece os produtores pelo teor de gordura e proteína do leite. “A pontuação dos produtores é convertida em prêmios que somam 2 milhões de reais — e podem, inclusive, ser utilizados para comprar insumos na Central de Compras.”

A DIVISÃO DE ÁGUA HOJE HOJE PRIVILEGIA AS MICRODISTRIBUIDORAS

Água é uma divisão à parte na Danone, que tem vende a marca Bonafont em garrafas de 500 mililitros e galões retornáveis.

Em um movimento semelhante àquele junto à cadeia leiteira, a companhia vem fomentando esse mercado, priorizando pequenos empreendedores na hora de distribuir a água engarrafada pela Danone.

Desenvolvemos um programa em que 50% do volume de águas [vendidas com a marca Bonafont] é proveniente de microdistribuidoras. Significa que pegamos esses pequenos negócios, às vezes até informais, e transformamos em pequenas distribuidoras… Com isso, elas conseguem se desenvolver e gerar renda familiar”

Essas microdistribuidoras têm no máximo 50 colaboradores. Elas recebem treinamentos sobre como manusear, armazenar e transportar os produtos. Segundo a Danone, as vendas relacionadas à companhia respondem hoje por pelo menos 50% da renda desses negócios.

No fim de 2020, a Bonafont lançou sua Garrafa Manifesto, 100% produzida com materiais reciclados de embalagens anteriores.

“A garrafa traz em sua concepção a proposta de circularidade, por ser feita galões da linha Bonafont Re.torna em seu fim de vida. Não tem rótulo também como uma forma de reduzir o uso de plástico e facilitar o processo de reciclagem.”

DOIS PROGRAMAS APOIADOS PROMOVEM A SUSTENTABILIDADE NO CAMPO

Esse olhar para o impacto ambiental se traduz em dois programas apoiados pela companhia que apostam no conceito de agricultura regenerativa.

Um é o Projeto Flora, “que propõe aos produtores de leite uma integração entre pasto e floresta”. A ideia é favorecer, por meio do plantio de árvores em terrenos dedicados à pecuária, a retenção de carbono no solo, melhorando o bem-estar das vacas que pastam ali — e a qualidade do leite produzido.

O projeto está implementado numa unidade-piloto em Guaranésia (MG), que servirá como fazenda-escola para engajar outros produtores na prática. A Danone afirma que, “nos próximos anos”, expandirá o escopo dos atuais 3 para 188 hectares.

Outra iniciativa apoiada é o Programa Caruanas, parceria com o fundo Livelihoods, Sebrae/RJ e IPE – Instituto de Pesquisas Ecológicas. Aqui, o foco é estimular a agricultura orgânica e o uso sustentável da terra para preservar a água — mais especificamente a bacia hidrográfica da região de Tinguá, em Nova Iguaçu (RJ), onde a Bonafont operou uma fábrica até 2020.

A região abriga uma reserva biológica. Os produtores rurais recebem um “kit de iniciação agroecológica” e aprendem a irrigar a lavoura com um sistema de gotejamento. Hoje, são 94 agricultores engajados (49 já certificados como produtores orgânicos) e 310 pessoas impactadas, segundo a empresa. 

A meta é aumentar a renda dos produtores em 60% e converter 400 hectares para a produção orgânica. “Em janeiro, demos início à implementação do módulo agroflorestal do projeto, por meio de dois mutirões iniciais colaborativamente com os agricultores participantes.”

NA PANDEMIA, A DANONE TURBINOU O APOIO A DOIS PROJETOS SOCIAIS

Nas zonas urbanas, a Danone fomenta outras iniciativas que promovem a circularidade e a geração de renda. O Avante! Recicla visa fortalecer cooperativas de catadores de materiais recicláveis. O Kiteiras, por sua vez, cria uma rede de revendedoras no modelo de venda “porta a porta”. 

Hoje, são mais de 2 mil kiteiras engajadas (as mulheres são 90%) que recebem treinamento da Danone e os kits com produtos para revender em suas comunidades. O programa abrange cerca de 150 cidades em seis estados: Bahia, Ceará, Espírito Santo, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo.

A renda média das kiteiras, segundo a companhia, é de 1,5 salário mínimo (com cerca de cinco horas diárias de dedicação). A Covid-19, porém, impactou de forma pesada esses trabalhadores informais.

“Neste momento de pandemia, fizemos um aporte mensal tanto para as kiteiras quanto para os catadores do nossos programas. Com todo mundo em casa, as cooperativas também fecharam, então fica difícil sair e coletar o material para fazer a massa da reciclagem…”

Baseado na França, o fundo de investimento da Danone injetou, em 2020, cerca de 1,8 milhão de reais nos dois programas — uma espécie de auxílio emergencial. O dinheiro, segundo a empresa, foi alocado para compor renda (cada catador, por exemplo, recebeu um total de 1 230 reais) e adquirir equipamentos de proteção individual. 

“Acredito que nesse mundo pandêmico, o cuidado com as pessoas ficou ainda mais forte”, diz Cibele. “A Danone sempre foi norteada nesse sentido, de gerar sucesso econômico com impacto social e ambiental. Precisamos fazer negócios de uma forma diferente, cuidando da saúde das pessoas e do planeta.”


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