É quase impossível separar as histórias do crescimento do Grupo Sabin – com a organização de um instituto para gerir seu investimento social privado – da carreira da presidente Lídia Abdalla.
Quando ela foi contratada como trainee, recém-formada, em 1999, a empresa não tinha ainda a dimensão o impacto dos dias atuais. Colaboradora e empresa se desenvolveram aperfeiçoando sua atuação, seu trabalho e seu lado social. Cresceram juntos.
“No mesmo ano de 1999, em que comecei a realizar meu sonho de trabalhar com análises clínicas, o Grupo Sabin mudava sua matriz do prédio onde foi fundado, o mais antigo de Brasília, para o Brasília Shopping”, recorda Lídia. “Isso foi um marco importante em nossa história, sobretudo em relação à inovação e crescimento.”
Foi nessa época também que, de acordo com a visão das fundadoras Janete Vaz e Sandra Costa, o Grupo Sabin começou a implementar os primeiros selos de qualidade e, mais tarde, de responsabilidade social e gestão ambiental. Também intensificou seu olhar humanizado para as comunidades, inicialmente com projetos de voluntariado pontuais até a fundação do Instituto Sabin, em 2005.
Lídia, que iniciou a carreira na área técnica, também foi ampliando seus horizontes: cursou mestrado, assumiu cargos de coordenação e de gerência e estava lá, sempre a postos, para atuar e apoiar em ações de voluntariado – representativas da missão e do DNA acolhedor do Grupo. Desse período, ela relembra:
“Não sai da minha memória o projeto Criança e Saúde, quando íamos até as creches colher sangue de crianças, fazer os exames e depois entregar o resultado com as recomendações importantes às famílias. Eram projetos sociais que nasciam da vontade das doutoras Janete e Sandra, junto com líderes, gestores e colaboradores, de contribuir e participar mais ativamente da vida da comunidade.”
Desde janeiro de 2014, Lídia ocupa o cargo de presidente do Grupo Sabin, que hoje conta com mais de 6 mil colaboradores diretos e se expandiu para outros 12 estados no país, além do Distrito Federal, implementando também os projetos e ações do Instituto.
Na entrevista a seguir, Lídia Abdalla fala sobre essa parceria de crescimento profissional e sobre os aprendizados e desafios da jornada social que permeiam todas as ações do Grupo Sabin:
NETZERO: Olhando para trás, mais especificamente para 17 anos atrás, quando o Instituto Sabin iniciou suas atividades, o que mudou e o que se manteve?
LÍDIA ABDALLA: Naquele início, trabalhávamos mais focados na essência, na intuição, no espírito de voluntariado, o que é natural. Estávamos em um momento mais assistencialista e isso valia para quase toda a nossa linha de projetos. O ‘Criança e Saúde’, o programa para idosos e o próprio núcleo de fomento às pesquisas, que tinha o olhar de ajudar os projetos de pesquisa de universidades que não conseguiam apoio.
Mas passamos por processos de evolução e de maturidade fundamentais em diferentes etapas de gerenciamento. Sempre acompanhamos dados, mas só estruturamos indicadores pouco tempo depois.
Quando fizemos isso, passamos a medir o impacto dos projetos e o quanto poderíamos e deveríamos evoluir dentro deles. Foi quando mudamos pilares estratégicos de foco para evitar pulverizar investimentos e reduzir nosso impacto.
Fomos amadurecendo juntos e, ano a ano vieram os investimentos em inovação social e as parcerias com outras organizações e instituições sociais que olhassem para esse ponto. Esse era o foco quando criamos, por exemplo, a plataforma InovaSocial.
Mantivemos o foco inicial: a essência, a contribuição e a participação na comunidade, o espírito do voluntariado e de entender a importância da empresa e de seu impacto positivo em frentes distintas.
NZ: Como você avalia a expansão da atuação do Instituto Sabin para além da filantropia e da promoção de saúde, para trabalhar também no fortalecimento dos ecossistemas de impacto?
LA: Logo no início, tomamos a decisão de não buscar financiamento público e manter os projetos sempre com recursos do Grupo.
O Grupo Sabin manteve um crescimento constante e a cada ano pudemos aumentar os recursos destinados ao Instituto.
Em alguns momentos foi preciso revisitar parte dos projetos. Mantivemos o Projeto Pescar, do Rio Grande do Sul, por exemplo, desenvolvendo jovens para o mercado de trabalho. Mas, como o governo destinava incentivos às famílias de baixa renda, esbarramos na dificuldade em engajar participantes. Tínhamos um amor enorme e conseguimos manter o projeto por 10 anos e, por mais difícil que fosse encerrá-lo, foi preciso. Entendemos que já havíamos dado nossa contribuição e precisávamos nos voltar a outras iniciativas. Aprendemos muito com ele e passamos a olhar para mais para a inovação e o empreendedorismo social.
Nesse momento, o Grupo Sabin crescia geograficamente e já atuava em outras regiões do país e com os recursos do Projeto Pescar, passamos a levar outras ações do Sabin para novas localidades, ampliando o impacto positivo na vida de pessoas, instituições e organizações sociais.
NZ: Você já se envolveu diretamente com alguma ação de voluntariado promovida pelo Instituto? Se sim, pode compartilhar alguma experiência marcante?
LA: Meu contato com o Instituto Sabin sempre foi próximo – até porque sempre acreditei no impacto que a participação da liderança tem na equipe. Participei da criação do comitê de gestão e também faço questão de estar ativa e ser voluntária nas ações.
Para mim, o que sempre marcou foi o projeto Criança e Saúde, que cresceu demais, tem outra estrutura e ganhou nome novo ‘Saúde+’. Podemos ver ali a formação do cidadão. Quando olhamos para a importância da cidadania no país, falamos sobre como o indivíduo, o cidadão, é formado enquanto criança e isso está intimamente ligado à educação e saúde.
Atuei nas creches, tanto na coleta como na apresentação dos resultados; busquei médicos voluntários para consultas. Sempre foi claro o quanto aquilo era fundamental para as instituições e para as crianças e o impacto direto que tinha nas famílias. Para nós, são coisas simples e óbvias, que estão ao nosso alcance, mas a realidade ainda é muito difícil para as pessoas que vivem sem acesso ao básico, inclusive para evitar e tratar doenças.
Mais recentemente, me marcou ser voluntária na campanha de vacinação contra Covid-19, promovida pela Secretaria de Saúde do DF. Era um momento delicado. Estávamos muito sensibilizados com o avanço da pandemia no brasil e no mundo. As pessoas estavam ansiosas pela vacina e diante deste cenário, mobilizamos mais de 2 mil colaboradores e eu estava lá todos os finais de semana, acompanhando as equipes e ajudando nos procedimentos e gerenciamento da ação.
NZ: Qual é a importância do Instituto Sabin para a agenda ESG do Grupo Sabin?
LA: É fundamental. Praticamente todo o S (de social) do Grupo está na agenda do Instituto Sabin. Embora muitas ações, sobretudo na área de gestão de pessoas, relação com colaboradores e parceria com fornecedores (e isso também é responsabilidade social), sejam genuínas aqui e aconteçam de forma orgânica, o nosso investimento social acontece via Instituto. Somos o único mantenedor da instituição, e nossos projetos sociais estão todos lá.
Também é importante reiterar que o conceito ESG, que hoje está no centro das estratégias das grandes empresas, é algo que sempre tivemos no nosso DNA. Faz parte da nossa essência. Nasceu junto com o Grupo Sabin. Sempre nos preocupamos com a o bem estar e a igualdade social e abraçamos ações de impacto positivo ao longo destes 17 anos do Instituto.
NZ: Existem boas práticas do Instituto que influenciam políticas internas do Grupo Sabin e/ou vice-versa? Há uma simbiose, digamos, organizacional entre as duas instituições?
LA: Sim, 100% de sinergia. Apesar de o Instituto ter sua governança independente da empresa, há um alinhamento estratégico em muitos pontos, especialmente no alcance geográfico e na potencialização das competências organizacionais em prol de pessoais em situação de vulnerabilidade.
O Instituto Sabin também nos apoia, por exemplo, em relação ao tema da qualidade de vida, e isso tem um impacto enorme nas comunidades onde atuamos, na vida dos nossos colaboradores e suas famílias.
Costumo dizer que são instituições diferentes mas não separadas. Sempre caminhamos juntos, com propósitos alinhados e convergência de entendimento e de atuação para potencializar nossos efeitos na sociedade.
NZ: Quais são as maiores dificuldades em atuar com investimento social privado no Brasil?
LA: Naturalmente temos os desafios macroeconômicos, relativos às dificuldades que o país enfrenta. Entendemos as necessidades de instituições e organizações, potenciais parceiros, diante das dificuldades em captar recursos, e entendemos também que há o desafio do propósito e da estruturação para sermos capazes de direcionar recursos.
Um bom caminho para superarmos essas adversidades é olharmos sempre para o crescimento do negócio, investindo em inovação e tecnologia a fim de conquistar capital para o investimento social.
NZ: E quais são os principais equívocos cometidos nesse campo?
LA: Muita coisa aprendemos na prática. Nós mesmos passamos por situações delicadas, dilemas e dúvidas ao longo dos anos.
Mas um dos principais equívocos talvez seja pensar: “não vou fazer porque é muito pouco e não tenho condições de investir em um projeto grande” ou “sem um projeto grande, não vou conseguir impactar.
Outro equívoco é entender responsabilidade social apenas como doação, com caráter assistencialista e filantrópico. Responsabilidade social vai muito além disso. Há filantropia, há empreendedorismo social, mas estamos também falando de reduzir desigualdades. Isso significa também olhar para o tema diversidade e inclusão, para a representatividade das minorias dentro dos negócios etc. É possível fazermos muitas outras ações e programas para a redução da desigualdade social no Brasil.
NZ: Pessoalmente, quais foram os principais aprendizados que você teve atuando com investimento social privado (ISP)?
LA: O principal aprendizado é perceber o quanto nós temos a condição e o poder de impactar positivamente a comunidade e de fato sermos protagonistas na redução da desigualdade social.
Aprendemos nesta jornada a não olhar somente para a quantidade, para a dimensão. É imprescindível ter uma visão multifocal para enxergar a qualidade do resultado social alcançado. E esse é o nosso papel.
Se cada um fizesse um pouquinho, se cada pessoa, se cada indivíduo, se cada cidadão, cada empresa, independentemente do tamanho, fizesse um pouquinho, tenho certeza de que teríamos um país melhor, menos desigual e, portanto, mais justo.
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