“Você já tentou colocar um absorvente dentro de uma cueca box?”, escutou Emily Ewell, sócia-fundadora da Pantys, marca que produz roupas íntimas usando tecidos que absorvem o fluxo menstrual e, portanto, são mais sustentáveis, pois dispensam o uso de descartáveis.
A executiva nunca havia pensado por aquela perspectiva até que, em uma pesquisa com os consumidores, escutou queixas de pessoas sobre a falta de identificação com as peças mais femininas. E entre elas estava o público de homens trans – pessoas que não se identificam com o gênero feminino ao qual foi designado em seu nascimento. Ou seja: o termo “homem trans” ou “pessoa transmasculina” é indicado para tratar uma pessoa que nasceu com o sexo feminino, mas se identifica com uma imagem pessoal masculina.
“A gente fez um focus group para entender as experiências desse público. E decidimos que era interessante fazer produtos que levassem qualidade de vida às pessoas, mesmo sendo uma porcentagem muito pequena do mercado. Conseguimos trazer um impacto muito grande para quem está em transição, ou mesmo para mulheres que têm muita dificuldade em achar opções confortáveis”.
Com a ideia do produto em mente, a marca produziu alguns pilotos e enviou a homens trans. “Pedimos para nos darem um retorno sobre a modelagem, o tecido. Foi uma coisa meio natural”, diz.
Meses depois, em junho de 2021, a Pantys lançou a primeira cueca absorvente do mercado. E seguiu os mesmos moldes das calcinhas fabricadas pela marca, com produção 100% brasileira: tecido biodegradável, capaz de matar 99% bactérias (e, assim, evitando odores), com durabilidade de dois anos ou 50 lavagens.
O lançamento da cuecas contou com uma campanha repleta de depoimentos de homens trans – um depoimento sobre as dificuldades de ainda lidar com a menstruação. “Foi o nosso produto mais abraçado pela comunidade. Foi muito bonito”, comemora.
O produto nem de longe é o campeão de vendas, pelo menos por enquanto, uma vez que foca em um nicho bem específico. Segundo pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu da Unesp (Universidade Estadual Paulista), cerca de 2% da população adulta brasileira é identificada como transgêneros ou não-binários. “Do ponto de vista médico, isso é relevante porque existem necessidades que são particulares desse grupo de indivíduos”, afirmou o médico psiquiatra Giancarlo Spizzirri, autor principal do artigo ao Jornal da Unesp.
“A gente vê no canal global que entra como as top days dos produtos vendidos porque é um produto bem diferenciado lá fora e aqui no Brasil não tem nada parecido”.
“Nós preferimos fazer um produto que leva qualidade de vida aos clientes para um percentual menor do mercado do que tentar fazer coisas para todo mundo. Isso é muito mais alinhado ao que a gente acredita”.
DE OLHO NA DIVERSIDADE
As cuecas trans não são a primeira da Pantys para nichos específicos. A marca lançou recentemente calcinhas com abertura nas laterais, para facilitar o uso entre pessoas com algum tipo de deficiência.
“Também temos muitos clientes com autismo, que não conseguem usar absorvente externo, por causa da superestimulação, da sensibilidade extrema”.
A marca fabrica ainda sutiãs absorventes, voltado para mulheres em fase de amamentação – para evitar que o leite escorra e deixe as blusas marcadas. Outro lançamento recente são as calcinhas para mulheres com incontinência urinária. Todos os tecidos utilizados na fabricação das peças são feitos com fios biodegradáveis capazes de se decompor em até 3 anos se forem descartados em aterros sanitários.
A atenção à saúde pública vem da própria formação e atuação profissional de Ewell. Engenheira química de formação, antes de fundar a Pantys junto com a sobrinha Maria Eduarda Camargo, ela trabalhou em grandes empresas farmacêuticas. “Foi, para mim, uma junção de coisas diferentes: essa paixão pela saúde, o empreendedorismo, e a vontade de fazer coisas que tenham impacto”, diz. E deu certo: em apenas oito meses, a empresa conseguiu recuperar todo o dinheiro investido e chegar ao breakeven (quando custos e receitas se igualam).
ESG
A Pantys respira ESG desde seus primeiros passos. Certificada pelo Sistema B, ela foi criada nas bases da sustentabilidade, da redução do impacto ambiental, no cuidado com a diversidade, e com a distribuição de renda.
Pesquisas da empresa apontam que em quatro anos uma mulher utiliza 780 absorventes descartáveis, que equivaleriam a R$ 228 e 27,3 kg de lixo. Estes produtos são feitos de um material que demoram quatro séculos para se decompor naturalmente. A expectativa de Ewell é que, num futuro próximo, nenhuma mulher precise usar mais esse tipo de absorvente, uma vez que o mercado já oferece opções menos poluentes para o período menstrual.
E, por falar em futuro, a marca almeja inaugurar uma loja física na cidade do Rio de Janeiro em breve. “Ainda não escolhemos o lugar, mas é um plano”, revela. Por enquanto, além do e-commerce, a Pantys possui uma loja física na capital paulista, no bairro dos Jardins.
**Leia mais sobre a Pantys no Projeto Draft
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