“Marcas ativistas têm o poder de mudar uma lógica e salvar vidas”, diz executiva sobre projeto da La Roche Posay em Goiás

Quando trocou o terceiro setor para atuar em uma multinacional, Helen Pedroso, diretora de Responsabilidade Corporativa e Direitos Humanos da L’Oreal, sabia o que procurava: uma empresa que investisse em projetos e causas. Como ela mesma diz, muitas dessas empresas tem um PIB maior que o de muitos países, o que aumenta o seu poder de fazer diferença.

No caso da La Roche Posay, uma das marcas do grupo L’Oreal, um projeto alterou por completo a vida de uma comunidade no interior do estado de Goiás. O povoado de Araras, com 800 habitantes, chama atenção por ser afetado por uma doença rara, o xeroderma pigmentoso. Enquanto no mundo a doença atinge uma a cada 1 milhão de pessoas, em Araras, há um caso a cada 40 habitantes. “É uma população que precisa ser vista”, diz Helen. Para lidar com a situação, a La Roche Posay criou, em 2015, o Projeto Araras, em parceria com médicos da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), e que leva à comunidade atendimento, diagnósticos e realiza cirurgias sempre que necessário.

O projeto nasceu de uma outra grande ação da marca, o Tour Contra o Câncer de Pele, que acontece desde 2009 e tem os mesmos objetivos do projeto em Araras, mas com foco no câncer de pele. O Tour já atendeu mais de 30 mil pessoas e realizou quase 3.000 diagnósticos da doença.

GENÉTICA E EXPOSIÇÃO SOLAR

O xeroderma pigmentoso tem origem genética e não é contagioso. Ele afeta ambos os sexos e é caracterizado por uma extrema sensibilidade à radiação ultravioleta (presente nos raios solares). Ou seja, afeta as áreas do corpo mais expostas ao sol como a pele e os olhos. Em pessoas com esse problema, após exposição à luz solar surge um “defeito” no reparo do DNA, com possibilidade da pele formar câncer cutâneo. Em números: o xeroderma pigmentoso aumenta em mil vezes a probabilidade de desenvolvimento do câncer da pele.

“Quando você olha os dados da OMS, o câncer de pele é o que mais atinge pessoas no mundo. No Brasil, ele corresponde a 33% dos diagnósticos (INCA), onde são registrados por ano 185 mil novos casos. Outro dado: apenas 6% dos brasileiros têm como hábito ir ao dermatologista. É muito pouco. Nesse universo dermocosmético, muitas vezes são produtos inacessíveis para grande parte da população. Como tornar isso acessível? Por meio da conscientização, educação e parcerias, puxando a sua responsabilidade de impacto a curto e longo prazo. Então juntou-se a vocação própria da marca, sua expertise de trazer produtos de alta qualidade, e a possibilidade de construir uma resposta a uma questão de saúde pública”.

Embora o projeto seja recente, ele integra uma cadeia de ações que a La Roche Posay vem realizando há alguns anos, seguindo os princípios da marca, cujo business model está ancorado no propósito de transformar vidas por meio da dermatologia e alinhadas ao programa L’Oréal para o Futuro, que estabelece compromissos para a companhia até 2030.

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E O AUMENTO DAS DOENÇAS DE PELE

Ações de prevenção para doenças de pele são cada vez mais necessárias quando pensamos nas alterações climáticas do planeta.

Hoje, mais de 1,9 bilhão de pessoas sofrem de problemas de pele no mundo, mais de um quarto da população mundial. Estudos recentes mostram que câncer, acne, dermatite atópica, psoríase, melasma, dentre outros, podem afetar a qualidade de vida como um todo e, com as mudanças climáticas, os riscos de desenvolvermos essas doenças é cada vez maior. No Brasil, os números também refletem uma situação delicada: segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), o país deve registrar cerca de 220 mil novos casos de câncer de pele por ano, no triênio 2023 a 2025, e 63% da população não faz o uso de nenhum tipo de proteção solar, segundo a SBD. 

“É importante que a gente entenda o poder que uma marca tem de mobilizar e liderar um processo. Entretanto, a execução e articulação de uma questão tão complexa precisa de soluções complexas. Em Araras, o maior ganho é garantir o acesso à saúde. A partir desta iniciativa, outros parceiros foram chegando. Neste ano, tivemos mais intervenções do governo estadual e prefeitura, com estrutura para emissão de documentos, doação de cesta básica, fralda, e atendimentos em outras especialidades. O xeroderma traz também problemas de visão, e conseguimos a doação de 78 óculos este ano, por exemplo”, conta Helen.

Para otimizar os atendimentos, uma dermatologista vai a cada 15 dias na comunidade para acompanhar os pacientes. Com este projeto, a marca acredita reduzir a espera de alguns pacientes que ficam na fila do SUS durante meses aguardando cirurgia, e, por meio da ação, conseguem a remoção das lesões. Até agora já foram 107 cirurgias realizadas e 1.936 atendimentos a moradores com o xeroderma pigmentoso.

ÁRVORES QUE TRAZEM SOMBRA E ALÍVIO

Para reduzir a intensa exposição solar na região, onde o sol pode ser escaldante e causar queimaduras graves nos portadores da doença, o Projeto Araras comandou o plantio de 300 árvores no local, em 2017, para aumentar a área de sombreamento no povoado.

A vegetação atenua a radiação solar e, consequentemente, o aquecimento do solo ou das construções, reduzindo a temperatura superficial, cuidado essencial para prevenir a doença ou reduzir os impactos em quem já foi diagnosticado.

Outra iniciativa foi dar início a um estudo genético da doença na região. Em 2016, a marca levou para Araras especialistas locais e internacionais, incluindo o geneticista Alain Sarasin, considerado o mais renomado especialista em xeroderma pigmentoso do mundo, junto ao professor Carlos Menck, geneticista da USP, para apoiarem a equipe no mapeamento genético dos moradores. 

O objetivo do estudo é avaliar oportunidades futuras relacionadas ao projeto e à pesquisa científica. O investimento do Grupo L’Oréal na pesquisa, que segue em andamento e deverá ser publicada em breve, foi de R$ 122 mil em 2017. Até o momento, cerca de 500 pessoas na comunidade de Araras foram mapeadas com o gene da doença. 

“Este projeto é um case que mostra como você pode levar luz a uma comunidade, mudar uma lógica e salvar vidas graças ao impulsionamento de uma marca ativista. É muito interessante ver como um projeto pode, com consistência e alto investimento, em uma única localidade, gerar impacto importante no acesso à saúde. Eu vejo poucos exemplos de investimento muito claro em uma única região e por um longo período. Isso tem sido cada vez mais raro, não só na visão do terceiro setor, mas de políticas públicas, na saúde. Sempre reconheço empresas e parceiros que gostam de insistir nesse otimismo teimoso e acreditam neste tipo de investimento”.