Provocar o conselho administrativo e os principais executivos da empresa é a função do Comitê ESG do Grupo Fleury. Pelo menos essa é a visão de Márcio Mendes, presidente do Conselho de Administração e líder do Comitê ESG da companhia.
Com 95 anos de história, 13 mil colaboradores e um corpo médico de 3 mil pessoas, o Grupo Fleury vem diversificando seu portfólio de atuação nos últimos anos para além dos laboratórios. Cerca de 20 marcas fazem parte do grupo, como a Sommos DNA, focada em testes genéticos; a Kortex Ventures, operação de venture capital; e a Saúde ID, marketplace de serviços de saúde. Além disso, desde novembro de 2020 a empresa faz parte do Índice Dow Jones de Sustentabilidade, da Bolsa de Nova York, assim como do Índice de Sustentabilidade Empresarial, da B3.
Criado em abril de 2021 com o intuito de acelerar a pauta ESG da companhia e ajudá-la a focar em prioridades, além de acompanhar o desenrolar dos projetos, o comitê tem 3 membros externos ao grupo: Glaucimar Peticov, Diretora Executiva do Bradesco; Cristiane Correa, jornalista e consultora; e Jéssica Silva Rios, especialista em Gestão e Mensuração de Impacto e ESG, além de Mendes.
Formalmente, eles se reúnem a cada 2 meses para discutir e definir as principais provocações e ações. Porém, no mundo conectado de hoje, o contato é muito mais frequente, até porque a pauta ESG está cada vez mais quente e necessária. Mendes explica:
“O Grupo Fleury almeja o papel de protagonista em uma pauta ESG no Brasil. O comitê veio para colocar a empresa em outro patamar, avançar ano após ano e trazer um impacto cada vez maior para a companhia e para a sociedade. Esse é nosso grande objetivo.”
Em conversa com NetZero, o líder do Comitê ESG detalha as ações e funções desse grupo dentro da estratégia do Grupo Fleury.
NETZERO: Por que o Grupo Fleury decidiu ter um comitê ESG?
MÁRCIO MENDES: Desde a sua fundação, a empresa tem a preocupação de fazer as coisas de maneira ética, cuidar dos stakeholders, acolher e respeitar o cliente. Ao longo das décadas esses valores foram evoluindo e, hoje, isso se traduz dentro da sigla ESG. Com a pandemia, a importância da medicina na vida e nas prioridades do brasileiro ficou ainda mais evidente. O grupo já tinha diversas iniciativas em termos de propósito e sustentabilidade, além de iniciativas sociais e filantrópicas, e sentiu que era o momento de acelerar –e a criação de um Comitê ESG é uma ferramenta para isso.
Havia centenas de projetos em andamento na empresa que já estavam, de certa maneira, relacionados à pauta ESG. Mas se a gente começasse realmente a focar e a priorizar, iríamos conseguir um impacto muito maior. O comitê surge dentro desse contexto de colocar essa pauta ESG em outro patamar para impactar um universo maior de pessoas.
Estrategicamente falando, qual o papel do comitê?
Eu enxergo o comitê como um agente provocador e catalisador. Provocador no sentido de questionar porque vamos fazer tal coisa, e criar esse diálogo interno. Fizemos isso, por exemplo, na definição da meta do grupo de ser net zero até 2030.
O papel do comitê naquele momento foi tirar as pessoas da zona de conforto e provocá-las a trazer a meta o mais próximo possível. O segundo ponto importante é o que eu chamo de catalisador no sentido de alimentar o conselho com essas preocupações e provocações e, também, pensar em como colocar em prática e executar tudo isso.
É preciso unir a estratégia e a ambição com a execução dessas medidas. Por isso o comitê tem uma função importante no meio de campo entre o conselho e a área executiva da companhia.
Como funciona o comitê na prática?
É um comitê que chamamos de assessoria ao conselho, ou seja, é um órgão que está diretamente relacionado ao Conselho de Administração. Uma das funções é influenciar esse desenho da estratégia de longo prazo, para que cada vez mais as ações ESG estejam diretamente relacionadas aos pilares estratégicos. De outro lado, o comitê tem a função de traduzir essa pauta ESG para o universo interno da companhia, porque não adianta ter uma ambição muito abstrata e teórica e ela não conversar com o dia a dia da empresa.
De que forma o comitê já impactou nos negócios do Grupo Fleury desde que foi criado?
É um comitê ainda muito jovem, mas nesse primeiro ano conseguimos colocar em prática algumas ações bastante significativas. Em julho de 2021, o Grupo Fleury foi a primeira empresa de saúde do Brasil a fazer uma emissão de debêntures com metas ESG atreladas. Fizemos uma emissão de 1 bilhão de reais de dívida e nos impusemos duas metas: uma de redução de resíduos e uma meta social, que é prover acesso à saúde de qualidade a um milhão de brasileiros das classes C, D e E.
Enxergamos que, cada vez mais, esse pilar social vai ser importante dentro da nossa sociedade. É um pilar onde o Fleury tem um potencial grande de atuação. Essas definições tiveram uma participação ativa do comitê porque estão relacionadas tanto à estrutura estratégica quanto financeira da companhia.
O comitê é formado por 3 pessoas de fora do Grupo Fleury. Por que e qual o papel destes membros externos?
No dia a dia de uma operação, você sempre acaba tendo um viés da companhia. Pelo fato de o comitê ser um elemento provocador, é fundamental trazer esse olhar externo à organização. Quanto mais a gente conseguir captar esses olhares externos, essas diferentes experiências, mais temos a ganhar.
Cada vez mais vamos precisar dessa construção se quisermos almejar o papel de protagonista de uma pauta ESG no Brasil, que é um pouco da nossa ambição. Queremos assumir uma posição de empresa que vai além, que faz algo fora da sua bolha. Queremos ser percebidos como uma empresa que está tomando iniciativas de protagonismo e que isso influencie outras empresas.
Para isso, precisamos trazer essa combinação de experiências para entender o que está sendo feito em outros lugares.
O Fleury é uma empresa de medicina. A área médica tem algum papel dentro desse comitê?
Em todas as reuniões, entre outros participantes, há três pessoas com formação médica: a Jeane Tsutsui (CEO), o Fernando Alberto (vice-presidente do Conselho de Administração) e o Rui Maciel (membro do Conselho de Administração). Embora não sejam membros do Comitê ESG, eles participam como convidados dessas discussões trazendo “inputs” de quem tem essa visão de dentro da atividade-core.
Como é a dinâmica do conselho?
Nossas reuniões formais são bimestrais. Tivemos 6 encontros no ano passado. Mas nossa interação extrapola muito essas reuniões. A partir do momento em que existe um tema, não perdemos tempo e tentamos ter contato, seja entre os membros do comitê, seja do comitê com os executivos, seja do comitê com o conselho.
Ainda estamos tentando entender qual vai ser esse modelo ao longo do tempo, mas temos conseguido, através dessas reuniões formais, avançar em diversos temas e deixar esse comitê cada vez mais estruturado. Também é importante falar que fora do comitê temos feito várias outras reuniões importantes, incluindo benchmark, ou seja, temos feito encontros com representantes de empresas reconhecidas por ter uma agenda ESG forte.
Com quais empresas já fizeram esse trabalho de benchmark? E por quê?
Constantemente estamos atrás desses exemplos, até para perguntar a essas empresas como foi essa jornada, em quais pontos elas ainda têm dificuldade, quais os desafios. Recentemente, conversamos com o Grupo Boticário e com a Suzano, empresas que se destacam dentro da agenda ESG no Brasil e têm histórias muito interessantes, que conversam com essa construção que estamos fazendo.
É muito legal conseguirmos nos espelhar e entender como essas empresas passaram pelo momento em que estamos hoje. Isso tem dado uma energia muito grande para nós em termos de ambição, de ver que é possível porque já foi realizado por elas.
Quais são as metas do comitê para 2022?
Um dos objetivos é atuar nas duas metas atreladas às debêntures. Fechamos uma parceria com a Quintessa, que vai nos ajudar a identificar rapidamente parceiros para que possamos investir e trabalhar juntos. No longo prazo, vai nos ajudar a identificar startups que possamos colocar dentro desse ecossistema que estamos construindo.
Também neste ano vamos lançar um projeto piloto em parceria com a ONG Amigos do Bem, para colocar em operação um serviço de telemedicina para populações que realmente necessitam. Enxergamos na digitalização do negócio um potencial cada vez maior não só para o business da empresa, mas pra atuarmos de um ponto de vista social.
Queremos expandir o negócio digital dentro do grupo, e, ao mesmo tempo, entendemos o valor social que isso pode ter em um país continental como o Brasil. Esse piloto com a Amigos do Bem vai ser muito importante pra conseguirmos desenhar dentro da pauta ESG um modelo social que vai trazer um impacto muito grande –ainda mais agora que ficou claro o gap de atendimento médico existente dentro do nosso país.
A longo prazo, que tipo de impacto o Grupo Fleury espera que esse comitê tenha nos negócios?
Primeiro, queremos inspirar todo o nosso grupo internamente. Mas, obviamente, para ter um impacto cada vez maior vamos ter que inspirar outros. A gente já tem feito um grande trabalho com a cadeia de fornecedores e quer cada vez mais se associar a outras empresas, construir e participar desse ecossistema.
As empresas no Brasil tem uma grande capacidade de impactar positivamente a nossa sociedade, sejam em projetos com visão social ou ambiental. A grande conclusão é que uma empresa não vai conseguir fazer tudo sozinha. Precisamos construir esse ecossistema, seja através de parcerias ou da cadeia de fornecedores. E o comitê veio pra ajudar a trazer um impacto cada vez maior.
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