A gigante de tecnologia HP – mais conhecida por suas impressoras – tem uma boa história para contar quando o assunto é ESG. Em 1991, nos Estados Unidos, os líderes da empresa decidiram tomar uma decisão a partir de uma dor básica do consumidor: o que fazer com os cartuchos de impressora quando a tinta acaba? Começava assim o programa global HP Planet Partners, inicialmente apenas como uma solução de coleta e reciclagem. Com o tempo, a ideia foi ampliando seu escopo e área geográfica ano a ano e acabou, inclusive, servindo de apoio a políticas de governos sobre gestão de resíduos sólidos que ainda engatinhavam naquela época.
Passado tanto tempo, as práticas da empresa evoluíram, alcançaram resultados ambiciosos e, em julho deste ano, a HP ganhou o Prêmio ECO 2022, organizado pela Amcham Brasil (Câmara Americana de Comércio para o Brasil), na categoria “Portfólio de produtos sustentáveis”.
Não foi apenas a reciclagem premiada. Esta é só uma etapa do processo. Trata-se de uma estratégia da empresa de economia circular.
CIRCULARIDADE
Nos últimos 20 anos, a HP já coletou 8,4 toneladas de cartuchos e hardware usados. Considerados por muitos consumidores como lixo, esses produtos poderiam ter sido despejados em um dos mais de 2,5 mil aterros sanitários ainda existentes no país. Em vez disso, seu destino foi o centro de inovação e reciclagem da empresa, no interior de São Paulo, onde foram reutilizados na manufatura de mais de 10 milhões de impressoras no país.
Entre esses novos produtos estão modelos como Tanque de Tinta, que conta com 40% de conteúdo reciclado, e HP Deskjet IA 2700, que tem capacidade de reutilização do plástico pós-consumo de até 45%. Atualmente esses são os carro-fortes de sustentabilidade da companhia, além de estarem entre os mais vendidos.
Tudo isso, graças a uma combinação de investimento, pesquisa, estratégia global de sustentabilidade e um ecossistema nacional que incentiva e facilita a circularidade. “No Brasil, graças aos investimentos em pesquisa e desenvolvimento decorrentes de políticas industriais fortes, temos a vantagem de contar com manufatura local e centro de desenvolvimento e reciclagem, um próximo ao outro, o que acelera muito esse ciclo de inovação”, afirma Diego Mutta, gerente de operações para circularidade e responsável por fazer a ponte entre projetos de sustentabilidade e manufatura de produtos.
“Justamente por termos essa capacidade de fechar o ciclo, receber premiações como o ECO é importante não só para reforçar nossas boas práticas, receber feedback e nos posicionar como marca como também para que a HP global veja a estruturação de nosso ecossistema”, completa Jessica Teixeira, gerente de sustentabilidade.
NÃO BASTA RECICLAR
O processo de sustentabilidade da HP no Brasil chegou anos mais tarde, em 2008. Nos Estados Unidos, o foco da companhia já estava mais avançado, e estudava-se de que forma os materiais resultantes da reciclagem poderiam voltar para a própria produção da HP como matéria-prima com o mesmo grau de qualidade – o famoso upcycling.
No Brasil, foi criado em 2012 um centro de inovação e reciclagem, em Campinas (interior de São Paulo). Idealizado, encubado e “rampado” pela HP em parceria com o Sinctronics (ecossistema de soluções sustentáveis para o mercado de eletroeletrônicos) é para lá que todo o plástico coletado no país é destinado.
O primeiro passo é a triagem, facilitada pelo fato de todos os produtos HP contarem com tecnologia RFID (etiquetas inteligentes com chips de identificação por radiofrequência), que permite sua identificação. Em seguida, ocorrem a desmontagem e a separação das peças por tipo e cores de plásticos, processo apoiado por um laboratório avançado também desenvolvido pela própria empresa, que identifica ainda possíveis contaminantes, como silicone e tinta.
Só então acontece a reciclagem propriamente dita, com trituramento, lavagem, armazenamento e aditivação química para recuperação das propriedades do polímero, e a transformação do plástico com a garantia de estar de acordo com a especificação de produtos HP.
Além do plástico pós-consumo, todos os cartuchos também recebem pelo menos 5% de plástico de garrafas pet retiradas do oceano por cooperativas e tratadas em plantas de reciclagem no Haiti. Certos modelos de computadores contam com 90% de alumínio e magnésio provenientes da indústria de metais reciclados.
“Cada vez mais estamos migrando para não usar materiais virgens, e a reciclagem foi o ‘start’ para esse processo de economia circular, nossa ferramenta de transição para atingir as nossas metas para 2030”, afirma Jessica. “Hoje podemos olhar para todos os pilares da sustentabilidade – não só de produto, mas também de compensação de carbono, por exemplo.” Exemplo disso é o apoio da empresa a projetos de conservação de florestas – um na Amazônia e outro na Mata Atlântica –, que têm como finalidade compensar o impacto uso do papel.
O S DO ESG
Desde 2018, a HP passou a incluir nesse ciclo as cooperativas de catadores, que se tornaram responsáveis por captar equipamentos e materiais descartados de forma inadequada e que, consequentemente, a empresa não consegue recolher por seu programa.
“O trabalho dos catadores é importante porque a realidade é que, apesar da Política Nacional de Resíduos Sólidos, no Brasil, apenas 2% do lixo eletrônico vai para a reciclagem de fato”, diz Jessica. “Todo o ecossistema de circularidade desenvolvido permite que a gente consiga fazer esse tipo de inovação social.”
Para isso, a multinacional desenvolveu um processo com 21 cooperativas no Estado de São Paulo, que inclui treinamento e capacitação para lidar com resíduos eletrônicos e evitar, entre outros problemas, vazamentos e contaminação de peças plásticas, além de avaliação social para melhoria de estrutura. Cerca de 400 cooperados estão envolvidos no projeto, que já impactou mais de 1.200 pessoas, que coletaram 600 toneladas de lixo eletrônico.
“Não temos outra saída, inclusive, para manter o sustento econômico da empresa: a extração de recursos naturais, que, aliás, são finitos, aumenta as emissões de gases do efeito estufa e tem influência nas mudanças climáticas. Por outro lado, se saímos desse modelo de concorrência por materiais cada vez mais escassos e criamos uma solução que extraia matéria-prima do que já foi consumido, estamos navegando em um outro ambiente que acaba sendo um oceano azul. É uma questão de sobrevivência.”
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