Renner investe em economia circular para provar que a moda pode ser responsável: “Sustentabilidade é nossa convicção”

Já há muitas décadas – ou séculos, já que a Revolução Industrial foi iniciada justamente pelo setor têxtil – a indústria da moda é sinônimo de consumo irrefletido e de descaso com trabalhadores e meio ambiente. Se depender da Lojas Renner S.A., contudo, essa imagem deve ficar restrita aos livros de história. A moderna indústria da moda é muito mais consciente e sustentável.

A Renner encerra neste ano de 2021 um ciclo que foi iniciado em 2018. Na época, estabeleceu publicamente uma série de compromissos ambientais. Entre eles, chegar a 80% de produtos de vestuário feitos com matérias-primas e processos de menor impacto ambiental, ter 100% do algodão certificado, usar no ambiente corporativo 75% de energia proveniente de fontes renováveis, reduzir 20% das emissões de CO2 em relação a 2017 e ter toda a sua cadeia nacional e internacional de fornecedores com certificação socioambiental.

Todas as metas foram atingidas – ou superadas – mesmo antes do fim de 2021. As emissões de CO2, por exemplo, hoje são 36,75% menores do que há cinco anos, e a marca planeja abastecer 170 lojas com energia eólica até o fim do ano que vem.

Agora, a companhia já está promovendo discussões internas para fixar novos compromissos para um próximo ciclo. Os detalhes ainda não foram divulgados, mas Eduardo Ferlauto, gerente geral de sustentabilidade da Lojas Renner, adianta algumas propostas:

“Queremos ser net zero em 2050 e reduzir em 30% as nossas emissões de gases-estufa até 2030. A sustentabilidade é uma convicção que a gente tem. Ela passou a ser um valor para nós em 2013, e desde então a nossa estratégia foi sempre começar pequeno, testar ideias e pensar no longo prazo.”

Alessandra Shargorodsky, diretora de arquitetura, engenharia e expansão da Lojas Renner, diz que “moda e sustentabilidade combinam, sim”. “É uma questão de aculturamento, paciência, trabalho colaborativo, contar com os parceiros. É um trabalho de formiguinha, de pesquisa e aprendizado, de busca de soluções.”

Em outras palavras, o retorno do investimento leva tempo – mas é isso que garante sua consistência. No ano passado, a Lojas Renner atingiu a pontuação mais alta entre 96 empresas integrantes do índice de ESG da B3 e do S&P Dow Jones. Além disso, é hoje a única varejista de moda a estar presente no S&P/B3 Brasil ESG pelo sexto ano seguido.

“A sustentabilidade é uma jornada. Quando a gente criou o conceito de moda sustentável, pensamos em um modelo de fazer negócios, de cuidar das pessoas, de cuidar do meio ambiente, de relacionamento com os parceiros. O mais importante é ter a visão de estratégia e agir com transparência”, completa Ferlauto.

INVESTIMENTO EM LOGÍSTICA REVERSA E RECICLAGEM

Um bom exemplo de uma ação sustentável que começou pequena na Renner, com diálogo com fornecedores e clientes, pesquisa e desenvolvimento, é a linha de roupas feitas a partir de materiais e processos de baixo impacto, batizada de Re – Moda Responsável, lançada em 2018. Hoje, 95% dos jeans da marca já são feitos dessa maneira, com algodão de cultivo responsável, materiais reciclados (sobras de tecido, fios que podem ser feitos a partir de garrafas PET, fibra de bambu) e tingimento natural, que gera menos resíduos.

A empresa também desenvolveu uma metodologia própria para medir o consumo de água nas etapas de lavanderia e acabamento das peças de Re Jeans, e o resultado foi um corte de 44% na chamada “pegada hídrica”. O processo foi expandido para outros materiais e coleções, como a Re Malha, lançada em 2019, que segue os mesmos princípios gerais.

Por trás desses investimentos está um conceito que nos últimos anos passou a ganhar força e escala na Renner: a economia circular, termo que designa o desenho de processos para reaproveitar tudo aquilo que normalmente seria descartado, seja pela indústria (na fabricação), seja pelo consumidor, como embalagens, frascos de perfume, acessórios e roupas.

É uma forma de pensar que se opõe à chamada economia linear, que ainda é predominante no mundo, segundo a qual as mercadorias seguem a clássica ordem da fabricação ao uso até o descarte definitivo, em um processo contínuo, normalmente predatório e cheio de desperdício.

Assim, quando a Renner coleta roupas usadas e as reinsere na cadeia produtiva, desmanchando os tecidos para reaproveitá-los em novas peças, está promovendo uma ação de economia circular, que inclui a logística reversa de coletar aquilo que não serve mais ao cliente. o gerente geral de sustentabilidade, Eduardo Ferlauto, explica:

“A partir do momento que a gente percebeu que nossos fornecedores enviavam 100% das sobras de tecido para aterros, começamos a questionar: será que é possível reduzir esse volume? Montamos um grupo técnico, buscamos parceiros como a Universidade de São Paulo para pensar soluções.”

O que começou como uma pesquisa para reduzir o desperdício de material, e a consequente pegada ambiental, acabou ganhando corpo.

“Isso é hoje um business case de sustentabilidade. Antes o fornecedor pagava para uma empresa levar suas sobras para o aterro sanitário. Agora, ao contrário, ele lucra com isso. Não é uma inovação disruptiva, mas sim uma forma de repensar o como fazer para fazer melhor. Montamos uma cadeia de logística reversa para o reciclador reinserir os tecidos no nosso sistema.”  

JÁ OUVIU FALAR EM LOJA CIRCULAR?

A loja que materializa boa parte dessa filosofia da empresa foi inaugurada há duas semanas no shopping Rio Sul, no Rio de Janeiro. Trata-se da primeira loja de economia circular do varejo brasileiro, que incorpora essa filosofia desde a sua construção até a operação cotidiana. Alessandra Shargorodsky, diretora de arquitetura, engenharia e expansão, explica:

“A Renner abre em média 30 lojas por ano, e em cada uma delas a gente ia estudando, ia aprendendo coisas novas sobre materiais mais eficientes e também sobre o comportamento dos clientes. Essa loja do Rio Sul é a concretização de todo esse trabalho de muitos anos.”

A executiva conta que desde o início do projeto a meta era conseguir reaproveitar 75% dos resíduos gerados na obra. O objetivo, contudo, foi superado: 97% dos materiais foram reaproveitados. “Quando falamos em circularidade, o grande desafio é analisar desde o começo todos os materiais que iríamos usar, de onde eles viriam, como seriam aplicados e como seriam descartados.”

Só em aço estrutural, por exemplo, a Renner deixou de utilizar 8,5 toneladas. A loja, além de ser mais eficiente no uso de energia, é abastecida por fontes renováveis – no caso, eólica. A preocupação com o consumo de água também deu resultado: no dia a dia, espera-se que o consumo hídrico seja 56% menor do que em um empreendimento tradicional.

A experiência do consumidor também deve ser diferenciada. “A loja foi pensada para privilegiar a circularidade e a omnicanalidade. Temos ali equipamentos mais leves, deixamos à disposição do cliente vários totens de compra e tablets, o produto aparece claramente exposto. Os provadores também estão mais confortáveis e inclusivos, e o próprio mobiliário da loja é mais sustentável”, completa Alessandra. Já a omnicanalidade refere-se à possibilidade de os clientes escolherem entre várias opções de atendimento e de pagamento, com ou sem o apoio dos vendedores da rede.

A loja circular abriga o primeiro Espaço Re da marca, dedicado às suas iniciativas de sustentabilidade. Além de apresentar as coleções da linha responsável da Renner, o local abriga um coletor do Ecoestilo, serviço de logística reversa para recolher embalagens, frascos de itens de perfumaria e beleza, além de peças de roupas usadas.

Por fim, a unidade terá o primeiro espaço físico do Repassa, um brechó online que a Renner adquiriu neste ano para aumentar suas soluções de circularidade.

A preocupação com sustentabilidade, contudo, não se restringe ao aspecto ambiental. O pilar social do ESG também foi contemplado na nova loja. No caso, a comunidade do entorno do shopping Rio Sul recebeu atenção do Instituto Lojas Renner, braço social da varejista, que desenvolveu ações de capacitação e apoio a pessoas vulneráveis – especialmente mulheres, população LGBTQIA+ e imigrantes pobres, a maior parte formada por venezuelanos.

“Essa é uma loja-piloto, e vamos realizar pesquisas semanais com os clientes para entender o que podemos melhorar”, diz Alessandra. Por enquanto, diz, o feedback é positivo.

“A loja está cheia e vemos muita gente perguntando sobre circularidade, querendo saber mais. Sabemos que esse é o início de um novo processo e vamos acompanhá-lo de perto.”

A segunda loja circular da marca deve ser aberta também na capital fluminense, em Jacarepaguá, no primeiro semestre de 2022.


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